Durante a história da humanidade, já nos deparamos com diversos momentos em que mostraram que o ser humano, pode ser a criatura mais cruel que existe. Muitas guerras já aconteceram e ainda acontecem e sempre as pessoas que mais sofrem com elas são as que, sem culpa nenhuma ou sem querer, são inseridas nesse cenário.
Acho complicado fazer comparações, aliás, não gosto disso, mas é impossível não comparar essa obra com Maus, que também já teve resenha aqui no site. Não estou comparando o sofrimento das pessoas envolvidas, muito menos querendo dizer que uma coisa é pior que a outra, mas a forma que a história é contada, tem muitas semelhanças.
Aqui somos apresentados a história de vida de Ok-Sun Lee, desde o começo, na sua infância pobre, com inúmeras dificuldades. Fome, total falta de condições de moradia e vestimenta, preconceitos, entre outros. Essas dificuldades, fizeram com que a sua família tomasse uma difícil decisão, deixar sua filha ser “adotada”, uma prática que acabou sendo comum naquela época. A esperança era que a filha tivesse uma vida melhor, mas na prática, a pessoa era comprada como uma mão de obra barata para trabalhar, ou para ser entretenimento em bares, ou pior ainda, para ser vendida para casas de prostituição.
Antes mesmo da guerra piorar, Ok-Sun já tinha passado por duas famílias e já tinha sofrido muito, talvez mais do que muitos aguentariam por uma vida toda, porém ela tinha apenas 15 anos. E foi nessa época que o pior de todos os acontecimentos da sua vida chegou, sequestrada, ela foi levada para as chamadas “Casas de conforto”. Essas casas foram uma maneira que o governo japonês na época encontrou para evitar uma revolta e ao mesmo tempo satisfazer os seus soldados que estavam lutando na guerra. A cada conquista de território, os soldados cometiam todos os tipos de abuso com mulheres e crianças, o que gerou um temor do governo japonês, pois um dos objetivos ao conquistar territórios, era recrutar os homens para o seu exército e com esses abusos, eles temeram uma revolta da população.
A história relata de uma maneira surpreendentemente leve acontecimentos horríveis, a autora tentou ao máximo contar a história sem expor, ainda mais, os envolvidos. A protagonista relata momentos de muito sofrimento e angústia, sem esperança de um futuro melhor. Os abusos que eram cometidos nas “casas de conforto”, com o aval do governo japonês, duraram durante toda a guerra, mas as marcas desse acontecimento, ficaram para sempre.
Mesmo depois que a guerra terminou, Ok-Sun ainda passou por muitas dificuldades, passou por dois casamentos que não tiveram desfechos agradáveis e mais de 50 anos depois de tudo isso, quando finalmente se reencontrou com sua família, mais uma vez foi deixada de lado, quando eles descobriram o que ela havia passado.
Não quero dar muitos detalhes dos acontecimentos relatados pela protagonista da história, pois acredito que o impacto ao ver na história seja maior e, de forma alguma eu quero diminuir o que aconteceu. Ao contrário do holocausto, que teve seus acontecimentos amplamente divulgados ao longo da história, o que é contado aqui, por muito tempo ficou escondido, somente após mais de 40 anos começou-se a tocar no assunto e mesmo assim, não é algo que todo mundo saiba. Aliás, até hoje o governo japonês não admite publicamente tudo o que aconteceu.
Hoje em dia, ainda não há uma indenização para as vítimas, não há um reconhecimento devido da história, não há sequer um pedido de desculpas. O grande mérito de Grama é nos mostrar esse gravíssimo crime de guerra em uma narrativa leve e chocante ao mesmo tempo, sempre com ênfase na força e determinação de sua protagonista para superar adversidades e manter-se viva.
“Mesmo derrubada pelo vento e pisoteada por muitos, a grama sempre se reergue.”
Keum Suk Gendry-Kim
Sobre a edição em si, a editora Pipoca & Nanquim está mais uma vez de parabéns. O quadrinho possui 492 páginas em papel offset 90g, capa dura, com sobrecapa com verniz localizado, lombada redonda e fitilho de tecido, com um acabamento perfeito, como é o padrão da editora.